terça-feira, 1 de julho de 2014

Que disciplinamentos nos oferece nossa disciplina?

A Geografia é um campo do conhecimento que
tem seus fundamentos nas origens de todos os povos.
Saber onde se está e, portanto, o significado de
se estar onde se está – os perigos, as disponibilidades,
as condições de realização de objetivos – é, e
sempre será, a linha divisória entre a possibilidade
ou não de se sobreviver. Nômades ou sedentários,
caçadores coletores ou plantadores criadores, do
campo ou da cidade, com hábitos rurais ou urbanos,
no meio dos oceanos, no interior das florestas
ou no centro de uma grande metrópole, saber
onde se está e, mais que isso, identificar e realizar
os comportamentos adequados que nos possibilitam
viver em cada um dos lugares do mundo é
parte fundamental da aprendizagem para qualquer
povo, em qualquer época.
Acontece que, para reconhecermos os lugares,
temos de associar dois conhecimentos básicos: o
reconhecimento do significado das coisas por meio
de suas formas e a identificação dos processos em
que elas estão inseridas com base em suas localizações
relativas. Assim, só a título de exemplo,
poderíamos afirmar que a totalidade da população
adulta saberia diferenciar um aglomerado de areia
de uma árvore (o reconhecimento da forma apontaria
para tal evidência), mas poucos reconheceriam
seus significados no interior de uma floresta
tropical ou num deserto. Para nos localizarmos, é
preciso mais que a forma e a localização geométrica,
é preciso fazê-lo também em relação aos objetos
que coparticipam do processo a ser analisado.
O “onde” da Geografia não é o mesmo “onde” da
Geometria, mesmo que possamos afirmar, como
geógrafos, que devemos usar os conhecimentos
geométricos e reconhecer que a origem da Geometria
foi a necessidade de sistematização de conhecimentos
geográficos.
Assim, estar perto ou longe, dentro ou fora,
no Ocidente ou no Oriente, acima ou abaixo ou
ainda qualquer outra referência de localização só
pode ser efetivamente reconhecida pela Geografia
se estiver associada à identificação de um processo.
Assim, por exemplo, nós, brasileiros, estamos a
oriente do Chile, a ocidente da África, mas pertencemos
ao mundo ocidental em função de nossas
tradições culturais e econômicas, cujas raízes estão
na Europa – a qual, por sua vez, é ocidente em
função de sua posição relativa com a Ásia.
O objetivo de quem ensina Geografia, portanto,
é ajudar os alunos a sistematizar nosso sistema de
referência, procurando reconhecer, na distribuição
relativa dos objetos do mundo, o significado de estarmos
onde estamos, isto é, o “onde” individual e
coletivo da humanidade.
Para tanto, precisamos conhecer a dinâmica dos
ventos, das rochas, das fábricas e dos campos agrícolas
(só para ficar em alguns exemplos), sempre
com o objetivo de, ao reconhecermos a localização
desses objetos (e a dinâmica que os define),
conseguirmos desvendar o significado de estarmos
onde estamos. Assim, quando, na Geografia perguntamos
“onde estamos”, tal pergunta não pode
ser vazia de processualidade, pois só podemos
reconhecer nossa posição quando a associamos a
outros objetos diferentes de nós, e isso só terá significado
se tais objetos estiverem a nós associados,
por um processo que possa ser reconhecido.
Assim, conhecimentos gerados pela Geometria,
pelas Artes Plásticas, pela Química, Física, Biologia,
Sociologia e Antropologia devem, sempre, ajudar a
construir nossos conhecimentos. Isso, de fato, não
torna a Geografia uma ciência que fala sobre tudo e
tenta copiar os conhecimentos das outras disciplinas.
Voltando ao ponto de partida, vale reafirmar: todos
os conhecimentos olham para o mesmo mundo, o
que os diferencia é a dúvida que move a procura das
respostas. Nós procuramos identificar o significado
de estarmos onde estamos e devemos utilizar todo
o conhecimento disponível para responder a nossas
dúvidas. Nesse sentido, a Geografia não se confunde
com nenhuma outra disciplina, independentemente
de muitas delas falarem do mesmo assunto, sem, no

entanto, terem o mesmo objetivo.

2 comentários:

  1. Gostei muito do texto Douglas!
    Inserir processualidade nas nossas investidas sobre o "onde estamos"...
    um grande abraço

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    1. Caríssimo, é preciso superar a idéia de que localização é, somente, um cruzamento de linhas. Sem eliminar a colaboração que a Geometria pode dar à Geografia, é preciso enfatizar que, ao se limitar a localizar algo sem evidenciar os objetivos de tal localização provocamos o empobrecimento do próprio fenomênico. O resultado de tal pobreza é, ele mesmo, pobre: sabemos onde as coisas estão, mas não sabemos que coisas são essas e nem mesmo o porque queremos saber de suas localizações.

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